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quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Editorial: Um privilégio escandaloso na aposentadoria de governadores

Brasília, 25/01/2011 - O editorial "Um privilégio escandaloso na aposentadoria dos governadores" foi publicado na edição de hoje (25) do jornal Valor Econômico:
"Boa parte dos políticos continuam empenhados na tarefa cotidiana de desmoralizar a democracia. Em vez de representarem os interesses de seus eleitores, defendem apenas os próprios e procuram estendê-los à custa do dinheiro do contribuinte. Em dez Estados brasileiros, ex-governadores recebem aposentadoria integral de até R$ 24 mil. A mais baixa delas é a concedida a sete governadores e quatro viúvas, no valor de R$ 12 mil, no Piauí, uma das mais pobres unidades da federação.
A maior, que é o dobro disso, sustenta ex-mandatários do Paraná, Rio Grande do Sul e Pará. Receber aposentadorias tão altas em um país pobre como o Brasil já é uma grande injustiça. É um escândalo, porém, quando se sabe que para qualquer cidadão é preciso trabalhar mais de 30 anos e contribuir durante o mesmo período, enquanto as aposentadorias privilegiadas podem ser usufruídas sem muito tempo de trabalho. Há casos de políticos que substituíram por uma dezena de dias o governador em exercício e ganharam direito a ter proventos mais que dignos pelo resto da vida, sem ter feito nada digno de nota em prol do bem público.
Essa pequena elite de privilegiados soma 135 pessoas, pelo que se sabe até agora, que consomem R$ 31,5 milhões por ano (Folha de S. Paulo, 21 de janeiro). Dela fazem parte políticos de todas as legendas, dos pregadores da moralidade pública e da austeridade fiscal, como o PSDB e o DEM, até aqueles que um dia defenderam a transparência nas coisas do Estado, como o Partido dos Trabalhadores. É o caso do senador do Acre, Jorge Viana, cuja aposentadoria vitalícia foi reinstituída quando ele estava no governo (Folha de S. Paulo, 22 de janeiro). Ele defendeu o privilégio como uma espécie de salvaguarda para si próprio. Outros, como o milionário Blairo Maggi, ex-governador do Mato Grosso, conhecido como o rei da soja, deram em seu mandato um jeito de ampliar os benefícios a governantes antes de saírem do cargo para concorrer ao Senado. Maggi garantiu para si por sete anos uma escolta ampliada de até 6 policiais pagos pelo erário (O Globo, 21 de janeiro).
É uma das leis não escritas da política brasileira - onde não há transparência na administração pública, alguém está ganhando dinheiro à custa do trabalho alheio. Em Minas Gerais, leis proíbem divulgar nomes de pensionistas. A justificativa é o crédito consignado, empréstimo com desconto em folha de pagamento, para o qual a jurisprudência garantiu sigilo sobre vencimentos. Não se sabe se os ex-governadores, com aposentadorias cuja legalidade é questionada, precisaram recorrer a empréstimos dessa ordem ou se o fizeram de fato. Mas estão cobertos igualmente pelo manto do sigilo. Os ex-governadores Aécio Neves e Itamar Franco disseram que não requereram aposentadoria. Mas os contribuintes mineiros pagam aposentadoria premiada para Francelino Pereira, um defensor da ditadura militar que, além de governador por eleição indireta, entre 1979 e 1983, foi presidente do maior partido do Ocidente, a Aliança Renovadora Nacional (Arena), que reunia os serviçais do regime militar. Junto com ele encontra-se outro ex-governador biônico, Rondon Pacheco. Como se fosse pouco, ambos ganham um dinheiro extra integrando conselhos da Cemig (Francelino) e do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais, no caso de Rondon (O Estado de S. Paulo, 21 de janeiro). Pendurados no galho da aposentadoria indevida estão outros políticos que serviram à ditadura, não foram eleitos e ocuparam mandatos curtos, de até um ano, como interinos. O Piauí tem vários deles: João Clímaco, Djalma Veloso e Hugo Napoleão.
Não são apenas os bons exemplos que se disseminam, os péssimos também. No Mato Grosso, alguns deputados e ex-deputados conseguiram, escorados por leis de 2001 em diante, pensão vitalícia, que subirá para R$ 20 mil em fevereiro, por contribuírem para um fundo de aposentadoria extinto em 1995. Em Santa Catarina, lei estadual de 2009 permite que servidores que tenham sido deputados estaduais mantenham o salário do cargo ao se aposentar, ainda que não mais o exerçam. O recorde histórico talvez fique com o Estado que paga pensão de R$ 15 mil para uma filha de Hercílio Luz, um ex-governador na República Velha. (Folha de S. Paulo, 24 de janeiro).
A Constituição proíbe a aposentadoria de ex-governadores. Está coberta de razão a Ordem dos Advogados do Brasil em recorrer ao Supremo para pôr fim a essa iniquidade. Que tenha sucesso na empreitada.

Fonte: Portal OAB

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